terça-feira, 6 de setembro de 2022

Autoestima

É incrível como uma mentira contada muitas vezes, torna-se uma verdade para a pessoa que a conta e, pelo menos, durante algum tempo (ou muito) para a pessoa que a ouve. Assim acontece com a autoestima. Ou, pelo contrário, com a falta dela.

Se alguém passar muitos anos a dizer-te que não prestas, que não sabes fazer nada, que todos são melhores que tu, que deverias ter vergonha, que és burra, que estás a ficar gorda, que estás a ficar feia, que estás a ficar velha, que não sabes cozinhar, que não sabes tratar bem da casa, do marido, dos filhos, da mãe, do pai, etc…, sei lá, tudo serve para te inferiorizar.

E então se for alguém da tua família ou com quem tenhas um relacionamento muito próximo, tu acabas por acreditar que essas pessoas têm razão. Afinal elas amam-te, pensas tu. Até agradeces a Deus o facto de as teres junto de ti para que elas te possam ajudar a perceber que afinal tens poucas qualidades que sejam admiráveis, que tens muito que te desenvolver para poderes ser melhor e tens ali uma pessoa do teu lado que te está a ajudar a fazer esse caminho pois vai-te dizendo as verdades que tu mereces ouvir. Que bom! Que grata te sentes! E agradeces a Jesus todos os dias por os teres na tua vida.

O problema é que à medida que os anos vão passando tu vais te apercebendo que todas as pessoas com quem trabalhas, sejam colegas ou mesmo os teus chefes, ou mesmo os amigos fora do ambiente de trabalho, te consideram uma pessoa muito competente, reconhecem-te inúmeras qualidades que tu esperavas ouvir daqueles a quem queres bem (da tua família) e não daqueles que acabam por ser temporários na tua vida. Mesmo assim ainda pensas: “Oh, aquela pessoa diz aquilo porque só me conhece aqui, neste ambiente. Se ela me conhecesse bem, se tivesse todo o tempo comigo, chegaria à conclusão que afinal eu não sou assim tão merecedora daquilo que ela diz sobre mim.”

Finalmente, um dia começas a despertar e começas a questionar-te: “Mas porque é que sou tratada de forma mais gentil, humana e respeitosa ‘fora de casa’ do que ‘dentro de casa’? Porque é que os outros reconhecem o meu valor, mas ‘em casa’ não?” Embora ainda seja um processo que demora anos até se tornar perfeitamente consciente no teu cérebro, tu já vais começando a fazer comparações diariamente. Chegas a casa e dizes: “Olha, sabes, hoje fui muito elogiada pelo meu chefe por ter desempenhado muito bem determinada tarefa.” ou “Hoje, consegui ajudar a empresa a obter um cliente que era muito difícil.” ou “Hoje ajudei os meus alunos a concretizarem um projeto espetacular”, são apenas exemplos, claro! E a resposta que obténs é: “O que é que isso me interessa? Pensas realmente que essas pessoas gostam de ti? Elas apenas dizem isso porque estás a fazer o que elas querem que tu faças! És um pau mandado. Deixas-te influenciar por tudo que te dizem!”.

Existem aqueles momentos em que tu te sentes um pouco melhor, mais animada, sentes que afinal tens valor porque, cada vez mais, o número de pessoas que te vai valorizando é maior e começas a subir a tua autoestima. Mas, depois, ouvindo amargas palavras como estas, pensas para ti: “Mas porquê? Porque é que é sempre assim? Porque é que não ouço uma palavra de alento? Uma palavra de reconhecimento?" E choras, choras muito, sem ninguém saber. Choras e pedes desculpa a Jesus por estares a agir assim, a sentires-te assim, a sentir que tens valor. E continuas a pensar: "Mas eu não me sinto superior aos outros. Eu reconheço o valor dos outros, mas eu também devo ter algum valor, não? Será que estou a pensar mal?" Há uma voz interior que diz que estás certa, mas depois, ali, ao teu lado, tens alguém que te mostra que te achas melhor que os outros. Pedes desculpa a Jesus e choras. É sempre o mesmo processo. Há muito tempo. E, assim, no dia seguinte, lá inicias o teu novo dia de cabeça baixa, porque afinal não vales assim tanto quanto pensas.
Até um dia...

Um dia, de repente, mudas a tela ao contrário e pensas: "Será que o mal está mesmo em mim? Ou será que o mal está naquela pessoa que mesmo afirmando que gosta de mim e que aquilo que diz é para o meu próprio bem, não consegue manifestar admiração por mim e, em vez disso, se sente inferior e, por isso, prefere humilhar-me para ela própria não se sentir diminuída?”

Este foi o ponto de viragem. É como se andasses anos cega e de repente começasses a ver. E com tanta clareza, meu Deus, que até magoa. Aí sim, começa a dor real, profunda, porque afinal iniciaste o teu processo de ENXERGAR A REALIDADE. E isso dói. Como pudeste ser tão cega? Tantos anos a ver apenas uma perspetiva, um lado, e afinal esqueceste que existem sempre dois lados da mesma moeda.

Então tu, que reconheces que todas as pessoas à tua volta têm valor, que todas as pessoas têm qualidades e defeitos, que todas têm talentos...!!! Se uma pessoa não tem talento ou não é boa a fazer nada, então porque Jesus a colocou na terra? Não tem lógica. Então, entendes: é porque TU TAMBÉM TENS VALOR!

E começas a perceber: “Espera aí? Algo aqui não está bem. Eu tenho confiança nos meus atos e nos meus pensamentos, então porque permito que uma pessoa me desvalorize tanto, ao ponto de eu me negar como pessoa? Afinal não é ela que está errada! Sou eu que estou errada! Essa pessoa está a fazer o papel dela, o caminho dela e está muito feliz por estar a conseguir atingir o objetivo a que se propôs em relação a mim. Quem sabe, terá uma evolução muito grande pela frente para fazer se quiser realmente mudar e melhorar o seu comportamento em relação aos outros. Mas isso é problema dela. Não meu. Eu tenho que fazer o meu caminho. E quanto a mim, eu é que estou errada. Sou eu que estou a permitir que me tratem assim. Sou eu que tenho que me valorizar e ver o apreço que os outros têm por mim e pelo meu trabalho. Eu tenho valor. 

É desta forma que tu começas finalmente a entender que, nem sempre aqueles que te são próximos (família, relacionamentos) são aqueles que te querem bem. Pode não ser por mal, até. Apenas não sabem ser de outra forma. Mas cabe a ti pensar se queres continuar a viver assim. É nessa altura, que tu começas a entender o verdadeiro significado daquela expressão popular: “Afinal se eu não gostar de mim, quem gostará!”

2 comentários:

  1. Então Faz o que falta fazer....Sente a Dor e limpa. Não tens que ficar na situação. Ela é um agente de perda. Abraço de luz

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