quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Mansinho

Mansinho, o gato do meu coração... Agora consigo escrever sobre ti ... 

As lições só nos podem vir de quem está mais próximo. E o Mansinho trouxe-me uma grande lição, ou melhor várias lições. 

Há quase três anos, numa manhã fria de novembro, o Mansinho entrou na minha vida. Eu tinha estado a alimentar os gatos de rua à noite, chuviscava e estava muito frio e ele tinha lá estado; já o conhecia, era manso e atrevido, independente e misterioso. Custava-me muito vê-los aí, a comer à pressa debaixo do carro, cheios de medo e de frio. O Mansinho tinha pedido várias vezes para entrar, mas não o deixei. Nessa noite, quando fechei a porta, ele tinha ficado no limiar da porta.  De manhã, doze horas mais tarde, ainda lá estava, no mesmo sítio. Senti que o Universo me estava a dizer que ele veio para entrar na minha vida. Abri-lhe a porta e entrou. Poucos dias depois ficou doente, as glândulas salivárias estavam aumentadas, ele mastigava, mas não engolia, emagrecia a olhos vistos. Para dar entrada na veterinária era preciso dar-lhe um nome, ficou Mansinho. Foi operado e recuperou bem, felizmente. Era mesmo muito manso e ao contrário dos outros gatos da casa, não procurava os lugares mais confortáveis para dormir. Gostava de variar de sítio, de experimentar as bancadas da oficina, o cesto da roupa, o lavatório, os móveis mais altos, a impressora, e de noite gostava de dormir à porta do meu quarto, como os grandes felinos na Roma antiga que dormiam a porta dos seus tutores. 

Quando lhe pegava ao colo sentia um Amor tão grande que não tinha sentido com nenhum dos outros quatro gatos que me eram próximos.

Há dois anos, o Mansinho tinha desaparecido durante dois dias e eu fiquei tão ansiosa, com o meu karma de apego à flor da pele. Sentia a falta dele como se tivesse desaparecido da face da Terra.

Num dia de maio do ano passado, o Mansinho despareceu sem deixar rasto. Às vezes estava mal-humorado com os gatos companheiros da casa e muitas vezes com os da rua. Quando saiu, num sábado, veio até à porta de entrada como que para se despedir, e depois partiu … Pensei que iria regressar depois da Lua cheia de domingo, mas não voltou ... Procurei-o, chamei-o por todo o bairro, de dia, de noite, nada … Aos poucos percebi que não voltaria… Provavelmente se teria escondido para morrer sossegado como os gatos muitas vezes fazem … Comecei a aceitar a me fragilizar, finalmente chorei, deixei de focar nele, no que tinha feito, para começar a focar em como me sentia, na tristeza enorme que sentia no meu peito. A vida me estava a propor um desapego forçado, já que não tinha conseguido desapegar quando ele ainda estava na minha vida; comecei a me pôr em causa, a entender que ele afinal precisava de mais liberdade, liberdade para se reinventar todos os dias, sem a sombra da minha preocupação de que lhe poderia acontecer alguma coisa … E chorei por não ter conseguido aproveitar de uma forma mais evolutiva o tempo que ele esteve comigo. Passada uma semana escrevi aos meus amigos uma mensagem de homenagem ao Mansinho : << … Foi uma lição que me deu, na vida e na morte : como viver e como morrer com dignidade. Ele, um verdadeiro felino, deixou-se tratar por duas vezes, na doença. Desta vez, provavelmente sentiu que tinha que ir. E foi com a dignidade própria de um felino. Até sempre, Mansinho ! Espera por mim to topo de Arco-íris ! Foste uma prenda do Céu na minha vida ! >> e comecei o meu luto …

Uns dias mais tarde, grande felicidade, apareceu o Mansinho, muito carente de festas, mais magro, esfomeado ... Eu estava muito contente e senti que ele tinha voltado para eu ter a oportunidade de treinar o meu desapego… a vida o tinha trazido de volta para continuar a me ensinar. Comecei a lhe dar mais liberdade …

O tempo passou e parte da lição ficou esquecida… de noite sempre o fechava em casa… Eu, no fundo, sentia que deveria respeitar os pedidos dele, mas o meu ego, a zelar pelo apego disfarçado de proteção, não me deixava … e eu me conformava com o “mais confortável” …  

Este ano, no final da primavera, dois dias antes da Lua cheia de maio, o Mansinho foi para a arvore do pátio, um jacarandá, e ficou a dormir em cima dum ramo grosso todo o dia, olhando para mim enquanto estava a trabalhar. Ao pôr do Sol, quando o chamei para comer, ele apanhou na direção oposta. Ainda fui abrir uma claraboia e quando me sentiu perto, desatou a fugir pelos telhados vizinhos até que o perdi de vista. Senti uma rejeição enorme, que já tinha sentido com pessoas, em tempos. A minha mente procurava incessantemente motivos para o que tinha acontecido, soluções rápidas, pensos rápidos, procurava o que poderia ter levado a este desfecho … Uma procura feita no campo errado … estava nervosa e me sentia injustiçada de o Mansinho me rejeitar assim … Finalmente comecei a cair em mim, na tristeza de as coisas serem assim … Fiz terapia da dor da rejeição, AUTOCURA, mas guardando em pano de fundo a ideia que ele ainda há de voltar, está é “mal comportado”, o que fazia como que eu não me rendesse por completo … Eu sabia que está tudo milimetricamente orquestrado no Céu e estava a limpar dores muito profundas, de vidas passadas de apego e rejeição. Um dia pedi ao Livro de Amor da Alexandra Solnado, uma mensagem. Recebi a mensagem 84, Insulto. Comecei a integrar, a interiorizar que, o que aconteceu não era contra mim, eu não era o centro do Universo e as coisas não giram à volta de mim, mas há um movimento próprio universal e, eu e o Mansinho fazemos parte desse movimento. A minha perspetiva mudou. Conseguia olhar para cima, para o ramo onde o Mansinho tinha estado antes de partir, e ver por trás o Céu. Grande lição, ao encarar a minha dor de apego, o Céu me amparava. Cada vez que atravessava o pátio, dezenas de vezes por dia, olhava para cima e via o ramo e o Céu e comecei a sentir gratidão pela lição - o meu karma de fé estava a ser trabalhado ao mesmo tempo – e sentia a ligação ao Céu cada vez mais forte. Nas meditações de AUTOCURA, no meu Templo, começou a aparecer o Mansinho, em Luz. Primeira vez, fiquei admirada e não lhe liguei. Quando apareceu segunda vez peguei nele e ao peito, como fazia na matéria, e senti profundamente aquele Amor divino, fiz crescer esse Amor e me nutrir, era mágico. Cada vez que ia ao Templo de Cura ele estava lá a assistir e no fim eu pegava-lhe e fazia crescer o Amor. Percebi que a lição era sentir profundamente a vibração do Amor e fazê-la crescer na minha vida. Também fiquei tranquila porque, pensava eu, se vai ao Templo de Cura provavelmente passou e já não está a sofrer. Percebi que o Mansinho veio mesmo para me ajudar a limpar os meus karmas, amorosamente. Ele fez o que tinha de fazer, de acordo com o movimento da Vida, esse fluido energético de sabedoria. Ele escolheu cumprir com a lição, não foi por me rejeitar, mas por Amor por mim. O Céu fez-me entender como foi difícil ir embora. Quando desatou a fugir, ele escolheu cumprir o seu desígnio, se ficasse mais um segundo, já não teria capacidade de seguir. Tinha ficado a me olhar do cimo do ramo todo o dia, a sentir que tinha que fazer a escolha, e cumpriu, fez a escolha mais evolutiva. Percebi, finalmente percebi, como isso foi difícil para ele. E chorei, e me rendi, à Luz.

Três Luas cheias mais tarde, em meados de agosto, o Mansinho voltou. Quase que me tinha esquecido como é bonito … Gratidão Mansinho pelos ensinamentos !

Aprendi que a chave é a aceitação ; aprendi a honrar a minha Alma e a Alma do Mansinho. Agora, de noite, quando é hora de dormir, se ele quiser sair, abro-lhe a porta … Ele tem que viver feliz !

Isso aconteceu comigo, mudou a minha vida, fez-me subir mais uma oitava na espiral evolutiva, e inspirou mais pessoas nas suas relações com humanos.

Bem hajas Mansinho !

PS. Enquanto estou a escrever :



1 comentário:

  1. Muitas vezes me pergunto o que acontecerá aos animais quando morrem.Quero crer que quando eu partir irei encontrar todos os animais que amei 😺🤗

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